Fluorescentes

As lâmpadas fluorescentes de mercúrio são resultado de uma significativa evolução tecnológica que proporcionou melhor relação custo-benefício aos consumidores, uma vez que, embora sejam mais caras do que as lâmpadas incandescentes, possuem durabilidade muito maior.

Além da durabilidade acentuada, as lâmpadas de mercúrio consomem menos energia elétrica, refletindo positivamente no bolso dos consumidores.

A combinação desses fatores (durabilidade e menor consumo de energia) poderia nos levar à conclusão de que a nova tecnologia é perfeita e propicia um conjunto consistente de bons resultados.

A realidade, entretanto, não é bem assim…

Esse tipo de lâmpada representa um grave risco à saúde humana e à proteção dos ecossistemas pela presença do mercúrio, um metal pesado que deve ser controlado com rigor.

O mercúrio tem a capacidade de penetrar a cadeia alimentar através do processo de metilação, formando um cátion organometálico denominado  metilmercúrio, contaminando os peixes e moluscos.

Além da contaminação dos organismos aquáticos é possível observar outra característica indesejável do metilmercúrio: a sua bioacumulação, ou seja, a capacidade de ser continuamente acumulado ao longo dos níveis tróficos da cadeia alimentar.

Em outras palavras, os consumidores finais da cadeia alimentar contaminada (ex.: o próprio Homem) passam a apresentar maiores níveis de mercúrio no organismo e como consequência maior probabilidade para desenvolver doenças graves.

No caso do Homem a presença de níveis elevados de mercúrio pode gerar doenças tais como disfunções do sistema nervoso, tremores, depressão, perda de visão e audição e deterioração mental.

Esse quadro conduz à morte, uma vez que o corpo humano não é capaz de excretar o mercúrio (em outras palavras é uma contaminação “para sempre”).

A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), instituída pela Lei n.º 12.305/2010, contempla a questão da contaminação por metais pesados e a necessidade de garantirmos a correta destinação dos resíduos sólidos contaminados (ex.: lâmpadas com vapores de mercúrio).

De acordo com o artigo 33 da PNRS os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de alguns produtos de elevada periculosidade serão obrigados a desenvolver sistemas que permitam a coleta seletiva dos resíduos contaminados e o seu encaminhamento às indústrias onde serão reinseridos na cadeia produtiva ou, alternativamente, dispostos em locais adequados.

“Art. 33. São obrigados a estruturar e implementar sistemas de logística reversa, mediante retorno dos produtos após o uso pelo consumidor, de forma independente do serviço público de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de:

I – agrotóxicos, seus resíduos e embalagens, assim como outros produtos cuja embalagem, após o uso, constitua resíduo perigoso, observadas as regras de gerenciamento de resíduos perigosos previstas em lei ou regulamento, em normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama, do SNVS e do Suasa, ou em normas técnicas;

II – pilhas e baterias;

III – pneus;

IV – óleos lubrificantes, seus resíduos e embalagens;

V – lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista;

VI – produtos eletroeletrônicos e seus componentes.”

Esses sistemas são denominados de “Logística Reversa”, ou seja, permitem que aqueles resíduos considerados como sendo mais perigosos à saúde humana sejam coletados e enviados às indústrias que os produziram anteriormente para submissão aos processos de reciclagem.

Com a reciclagem esses produtos passam a apresentar menor risco ao meio ambiente uma vez que estão submetidos aos sistemas de controle industrial e podem ser reintroduzidos em novo ciclo produtivo.  Esse circuito fechado minimiza a possibilidade de contaminação dos ecossistemas.

A PNRS inovou ao estimular a Logística Reversa, mas ainda precisamos aprimorar a questão da reciclagem das lâmpadas com vapores de mercúrio.

Nosso país ainda não possui um quantitativo suficiente de empresas especializadas na reciclagem das lâmpadas de mercúrio, que se reflete no processamento de 15 a 20% do total produzido anualmente.

Assim, a ausência de políticas governamentais destinadas a estimular a implantação de novas indústrias recicladoras com tecnologia de ponta condena nossos ecossistemas à contaminação.

O mesmo ocorre com os demais produtos listados nos incisos do artigo 33 da PNRS supracitada, em especial as pilhas e baterias.

Ora, não basta apenas instituir a Logística Reversa. É necessário dotar nosso país de um parque tecnológico que permita a reciclagem adequada e ambientalmente sustentável dos resíduos sólidos contaminados.

As soluções passam por diversas alternativas:

  1. a)  Concessão de renúncia de receita às indústrias que desejem implantar plantas industriais para processamento desses elementos perigosos;
  2. b) Criação de polos de reciclagem estaduais especializados no processamento dos componentes listados no artigo 33 da PNRS;
  3. c) Formalização e capacitação de cooperativas de catadores de resíduos para que promovam a coleta seletiva daqueles componentes e o seu correto encaminhamento às indústrias especializadas de reciclagem;
  4. d) Desenvolvimento de um projeto de educação ambiental consistente de modo a conscientizar os consumidores, cooperativas e indústrias acerca da necessidade de aprimorar continuamente a Logística Reversa;
  5. e) Formalização e implantação de consórcios municipais de modo a reduzir o custo para implantação de novas tecnologias de processamento dos resíduos;

Algumas dessas medidas já estão contempladas, inclusive na própria PNRS e precisam ser observadas, pois a Logística Reversa tende a incorporar novos componentes ao longo dos anos, tais como os plásticos, embalagens do tipo PET, etc.

O tratamento adequado dos resíduos sólidos é garantia de geração de emprego e renda, além de proporcionar maior arrecadação de tributos, qualificação da mão de obra local e dinamização do ciclo produtivo.

Há que se considerar, também, a melhoria dos indicadores ambientais, em especial no que tange aos níveis de contaminação do solo, dos recursos hídricos e ao comprometimento da biodiversidade.

Em síntese: a correta aplicação da PNRS pode transformar problemas ambientais em oportunidades socioeconômicas que beneficiarão toda a cadeia produção – consumo – descarte.

  • Marcelo Quintiere
  • Engenheiro, mestre em Gestão Econômica do Meio Ambiente
  • marceloquintiere@gmail.com